O título que
dei a esse texto não foi ao acaso, nem gratuito. Após assistir, no dia 11 de
agosto de 2012, ao espetáculo “Boneca Teresa”, apresentado pelo grupo porto
alegrense Teatro Imaginado, no Teatro do COP, saí pensando que os atores contemporâneos
estão precisando voltar a prestar mais atenção no significado da palavra verossimilhança.
Embora algumas
estéticas teatrais se proponham a trabalhar com personagens e situações
irreais, mesmo assim, quando os atores atuam nesses espetáculos, devem passar a
verdade de seus personagens, ou o que chamamos de verdade cênica. Entretanto, quando a estética é realista, ou
até mesmo naturalista, o ator não pode pecar na interpretação que permita ao
seu personagem a identificação como um ser humano que transpareça irrealidade.
Com concepção,
direção e atuação de Jordana de Moraes e Larissa Gonzales, o espetáculo baseado
na obra de Carlos Carvalho pecou na verossimilhança da interpretação das
atrizes. Apesar delas se esforçarem em imprimir a construção de personagem
tentando caracterizá-las corporalmente, saltava aos nossos olhos um excesso de
tensão muscular e apelo para alguns clichês interpretativos.
O espetáculo
conta a história de duas mulheres que se encontram trancadas num apartamento
onde um homem havia as levado para fazer um programa. As cenas eram entre
cortadas pelos diálogos das personagens prestando depoimento em uma delegacia
sobre o que realmente estavam fazendo naquele local. Evidentemente, há um
confronto e desvelamento de hipocrisias e falsos moralismos, à medida que a
personagem que se diz puritana vai revelando que sua situação não é muito
diferente da prostituta. Esse tipo de circunstância costuma ser uma armadilha
em algumas peças de teatro, pois cair em clichês é muito fácil e simplista.
A atriz que
fazia a personagem puritana exagerou na tentativa de mostrar uma pretensa
seriedade, ao passo que, nós espectadores, ficávamos com a impressão de que
mais parecia a caricatura de uma personagem de telenovela, do que de uma
realidade teatral. Além disso, a outra atriz, que interpretava a prostituta,
exagerou na tensão da musculatura da região escapular, na tentativa de imprimir
uma corporeidade peculiar à personagem. Apesar
disso, ficava claro que a atriz estava empenhada em investigar como seria a
personificação corporal de uma profissional do sexo. No entanto, acredito que
faltou um laboratório com maior afinco à construção dessa personagem e, após
esse período, uma dedicação maior ao exercício e à experimentação cênica, antes
de levar a personagem ao palco.
O universo
naturalista costuma abordar uma intensificação da realidade, em um ambiente que
desvela a hipocrisia da sociedade, questionando seus valores morais, por meio
de personagens que são frutos do meio em que convivem. Esse fato pode
contribuir para uma falsa impressão de que interpretar uma personagem tão real
seja fácil aos atores. Porém, a facilidade pode funcionar mais como uma
armadilha, do que como sucesso de atuação. Para dar a extrema realidade que o
papel exige, o ator não deve buscar saídas estereotipadas de caracterização
corporal, muito menos uma elocução teatralizada demais. Sendo assim, o ator
deverá, não apenas compreender o universo que as personagens estão inseridas,
mas também saber o porquê cada uma daquelas palavras está sendo dita naquele
momento da peça. Mas, além disso, deve construir os subtextos de cada fala,
trazer para o seu corpo essas informações de maneira limpa, coerente e sem
exageros.
Esses são
apenas alguns aspectos que o ator deve preparar antes de levar o seu trabalho
para apreciação do público. Quando há uma falha em algum desses processos,
todas as fragilidades ficam expostas e chamam atenção dos espectadores. Nesse
sentido, a grande perda do espetáculo se reflete na verdade cênica, gerando um
afastamento do envolvimento do público com a problemática vivida pelas
personagens. Desse modo, o que poderia vir a comover o espectador, acaba não
surtindo nenhum efeito.
Apesar de ter
feito muitas críticas ao trabalho das atrizes, não questiono a competência
profissional delas. Mesmo com o problema de concepção na criação das
personagens que citei anteriormente, as atrizes seguram o espetáculo e não
deixam em nenhum momento a impressão de que elas não tenham talento para o ofício
cênico. Como o espetáculo conta com a direção das duas atrizes, acredito que
lhes faltou um olhar de fora, distanciado do seu processo criativo para lhes
orientar e ajudá-las a fugir de algumas armadilhas cênicas.
Portanto, para
finalizar esse texto, gostaria de reforçar o conselho aos atores para dedicarem
uma atenção maior à verossimilhança de sua personagem. Apesar da diversidade de
propostas estéticas teatrais e dos hibridismos cênicos contemporâneos, o ator
não pode se perder no meio dessa profusão de informações e construir uma
personagem inverossímil. O espectador quer e necessita acreditar naquilo que
lhe está sendo contado para que ele possa mergulhar no universo imaginário do
espetáculo teatral. Para que isso ocorra, há a necessidade de um árduo, atento
e dedicado trabalho por parte dos profissionais das artes cênicas. Talvez, as
reflexões aqui deixadas ilustrem ao leitor o quão difícil é o trabalho de um
ator e o quanto devemos valorizar o empenho e dedicação desses profissionais.
MSc. Vagner Vargas
DRT – Ator – 6606 – Crítico Teatral.
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