sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Hibridismo, Ousadia e Arte Tendo o Teatro como Cenário e Contexto



            No dia 14 de setembro de 2012, os atores Ana Laura Barros Paiva, Lumilan Noda, Tai Fernandes e Tatiana Duarte, apresentaram o espetáculo “Olhar do Outro” em frente ao Theatro Sete de Abril. Já que o único teatro público da cidade de Pelotas está fechado, o grupo aproveitou a oportunidade para levar o seu trabalho para a rua, utilizando a fachada do prédio como seu cenário e o fazer artístico como mote de suas discussões.

Tendo o texto “A Gaivota”, de Anton Tchekhov, como referencial inicial de pesquisa, a diretora Alexandra Dias nos propõe um espetáculo que dialoga com outras linguagens artísticas, rompendo com as barreiras limitantes entre as diversas artes. Além do texto do escritor russo, o grupo utilizou textos de Rubens Figueiredo e Robert Patrick para compor a dramaturgia do espetáculo.  Além disso, a história era costurada por momentos, relatos e vivências pessoais de cada ator, dialogando com as passagens textuais dessas obras literárias, com o intuito de refletirem sobre o fazer teatral e a condição do artista no mundo contemporâneo.

Com um caráter de intervenção cênica no espaço público da cidade, o grupo propõe aos espectadores, além de outras abordagens, a discussão sobre qual o papel e o lugar do ator na sociedade. Essas reflexões acabavam sendo potencializadas pelo fato de estarmos assistindo a todos esses fatos, tendo como cenário de fundo um belo teatro, construído no século XIX, que hoje permanece fechado e representando o descaso que as artes cênicas sofrem nas políticas atuais.

O trabalho que os atores tiveram em se expor da maneira corajosa como fizeram, desvelando suas fraquezas pessoais, propiciou aos espectadores uma aproximação de histórias de vida que se identificam com os conflitos dos personagens literários. Esse tipo de diálogo entre ficção e realidade, relatos pessoais e textos dramatúrgicos vem sendo utilizado em diversos trabalhos artísticos que desejam desassossegar o espectador do seu olhar viciado nas estruturas formais e tradicionais das artes. Essas propostas além de oferecem ao público uma relação mais próxima com o contexto representado, lhe fomentam uma percepção diferenciada, um outro modo de encarar e se relacionar com os mais diversos tipos de situações que acontecem a sua volta.

 Nesse sentido, muitas vezes um espetáculo não precisa de palavras e expressões textuais, uma vez que suas imagens podem dar vazão a uma série de abordagens e os artistas não necessitam delimitá-las dentro de um contexto definido. Por esse motivo, a opção pode ser pela exposição dessas imagens e deixá-las para que o público vá compondo os espaços lacunares, conforme é tocado naquele momento.

Sendo assim, o trabalho em questão nos expôs uma série de imagens lindas, não apenas nas projeções, mas também na movimentação dos atores e na maneira como eles se relacionavam com todos os signos que estavam ali sendo expostos. Desse modo, não posso deixar de elogiar a maneira como o grupo se apropriou e re-significou alguns quadros surrealistas, do pintor belga René Magritte, brindando a plateia com outras possibilidades de leituras daquelas obras e do peso que essas imagens imprimiam no contexto do espetáculo.

 O figurino elaborado por Larissa Martins vinha muito ao encontro do contexto da peça do dramaturgo russo. Mas, além disso, os trajes extremamente belos, elegantes e bem acabados já nos chamavam a atenção no início do espetáculo quando os atores vinham chegando à esplanada em frente ao teatro. Nesse momento, poderíamos traçar relações sobre a tradição histórica que a população dessa cidade tinha em se vestir bem para ir ao teatro durante o século XIX e início do século XX. Porém, agora, essas pessoas disporiam apenas do espaço ao ar livre para apreciar o espetáculo. Apesar dessa relação textual e da percepção crítica sobre a situação, os figurinos também dialogavam com as obras do artista belga utilizado como referência e estavam extremamente adaptados à funcionalidade cênica de que havia necessidade.

A trilha sonora original e os vídeos de Thiago Rodeghiero compunham um ambiente no qual, ao mesmo tempo em que intervinham na paisagem urbana com as projeções, traziam o foco cênico para as discussões que os atores estavam propondo. A polifonia de informações da performance era sublinhada e ressaltada pelas projeções muito pertinentes que ajudavam a ampliar o leque de leitura das imagens apresentadas. Além disso, o crédito e êxito das projeções também se devem ao fato de fugirem do lugar comum e simplista que vemos em algumas peças de teatro. A utilização de filmagem e projeção ao vivo também foi muito interessante para os espectadores observarem o diálogo entre duas linguagens, enquanto a atriz Tatiana Duarte apresentava um dos textos mais lindos e difíceis de “A Gaivota”.

A maquiagem utilizada pelo grupo foi muito adequada ao contexto da concepção de encenação e à luminosidade que teriam nessa apresentação na rua. A iluminação de Juliano Bonh Gass fez mágica e mostrou muita criatividade para adaptar os recursos técnicos para um local ao ar livre que não dispõe de estrutura técnica para apresentações teatrais à noite. Nesse sentido, todos os recursos foram muito bem utilizados colaborando para a ambientação e contexto cênico.

O elenco inteiro está de parabéns pelas suas atuações. Mesmo sendo atores tão jovens, trabalhando em um espetáculo em que a performance se direciona à multiplicidade de imagens que compõem à plasticidade cênica, conseguiram trazer seus universos pessoais para a identificação dos conflitos das personagens daquelas histórias. Além disso, apesar das adversidades, os atores conseguiram segurar o espetáculo, mesmo sofrendo interferências desagradáveis de delinquentes que tentaram prejudicar a apresentação.

Mais uma vez, sou obrigado a falar da falta de educação de algumas pessoas em relação aos espetáculos que são apresentados em Pelotas. Nesse caso, por ser uma performance ao ar livre, os artistas já sabem que estarão expostos a quaisquer adversidades que possam vir a acontecer. Entretanto, isso não justifica que algumas pessoas se julguem donas do espaço público e se outorguem o direito de agredirem não apenas quem está se apresentando, como também quem está assistindo àquela obra.

O fato em questão se refere a mais de uma dúzia de jovens que estavam naquele local e não queriam permitir que houvesse uma apresentação teatral naquele espaço, pois desejavam utilizá-lo para dançar e cantar rap e hip hop. Em primeiro lugar, a Praça Cel. Pedro Osório é um espaço imenso e essas pessoas poderiam ter ido se expressar em outro ponto da praça, uma vez que o grupo de atores possuía liberação da prefeitura para apresentar o espetáculo naquele local, ou, simplesmente, se sentarem e apreciarem o evento. Além disso, a quantidade de bebidas alcoólicas que aqueles jovens faziam questão de mostrar que estavam ingerindo, não nos ilustrava que o seu intuito era apenas de expressar as suas músicas.

Não foram poucas as vezes que eles gritaram e tentaram atrapalhar a encenação, dizendo que queriam rap e se utilizavam do fato desse tipo de expressão estar associada às pessoas de classe social menos favorecida para tentarem intimidar a plateia a não reclamar. Acredito que seja muito fácil e cômodo se colocar no lugar e no papel de injustiçado quando não se respeita o espaço dos outros. Pela quantidade de bebidas alcoólicas que passavam de mão em mão e as dimensões espaciais da praça, também não acredito que aqueles jovens estivessem apenas com o intuito de se relacionarem com a arte. Antes de tudo, se desejam ter o seu espaço, precisam saber respeitar o olhar do outro em querer desfrutar de outras expressões artísticas.

Apesar de a plateia ter presenteado esses jovens com a indiferença, para que pudessem assistir ao espetáculo, financiado pelo poder público, acredito que os espectadores pelotenses não possam continuar sendo expostos a esse tipo de situação nas apresentações ao ar livre. Sendo assim, saliento o meu protesto quanto à ausência de guardas municipais e/ou da brigada militar durante o evento.

Essa interferência foi tirada de letra pelo grupo de artistas e acabou se tornando apenas mais um ruído desagradável que vinha de fora do ambiente cênico. Mas, em nada afetaram à qualidade do trabalho que ali foi apresentado.

Portanto, considero que a proposta trazida em “Olhar do Outro” seja de grande valia para as discussões do papel dos atores na nossa cidade e da maneira como as políticas culturais não vêem tendo a devida importância nesse município. Nesse sentido, espero que o grupo ainda possa apresentar esse espetáculo, de maneira segura, em outras ocasiões para que mais pessoas possam ter contato com esse diálogo híbrido entre as artes.

MSc. Vagner Vargas
DRT – Ator – 6606 – Crítico Teatral.
  

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Chapitô e o Teatro Físico Português


A companhia Chapitô, criada há 25 anos em Portugal, esteve em Porto Alegre/RS, de 05 à 07 de setembro, apresentando o espetáculo “Cão Que Morre Não Ladra”, no Teatro do SESC. Criado por Teresa Ricou, o Chapitô trabalha ativamente na formação artística e social de jovens de classes menos favorecidas.

O trabalho desenvolvido por essa companhia não se restringe apenas ao fazer artístico e à formação dos seus alunos. Agregado a esse coletivo, existem diversas entidades realizando atividades de cunho social, somando colaborações da iniciativa privada nacional, internacional e também de poderes públicos. Nesse caso, a arte é o meio catalisador para esse diálogo. Muito embora, nos dias de hoje, o Chapitô já conte com certa estrutura, isso foi construído com muito trabalho, seriedade e comprometimento social ao longo dos anos. O que ressaltou o trabalho desses artistas foi o fato de não ficarem apenas no limiar teórico e do embasamento de discursos polidos, o seu trabalho obteve o devido valor, dada à qualidade artística das suas produções.

As ações que esses artistas realizam para a integração de jovens em situação de risco e vulnerabilidade social por meio das artes é louvável e merece todo o nosso respeito. Friso e saliento bastante o trabalho do Chapitô, pois suas ações não têm nenhum caráter assistencialista, como vemos comumente em diversos trabalhos realizados pelo Brasil, onde o Governo libera grande soma de investimentos para atividades com objetivos semelhantes e o que observamos são olhares verticais assistencialistas do oportunismo de seus realizadores.

As técnicas circenses são o local de interlocução no processo formativo dos artistas oriundos do Chapitô. Entretanto, a multidisciplinaridade se faz presente e podemos observar claramente no corpo dos seus atores técnicas que advém do mimo, dança, teatro físico em geral, circo, clown, Commedia Dell Arte  e etc... O corpo do ator é o ponto de partida para a comunicação com os espectadores e para a criação das suas matrizes de trabalho nos espetáculos realizados pela companhia.

O espetáculo que veio a essa edição do festival Porto Alegre Em Cena, contava a história de uma família que possuía uma maneira muito peculiar de lidar com a morte e de como dar essa notícia aos outros membros da família. Em um tom de humor bastante ácido, a dramaturgia nos conduzia por um terreno absurdo, de uma família despedaçada e partida ao meio pela tragédia. Porém, finalmente reunida.

Logo de início, o público já é levado às gargalhadas dado o jogo cênico entre os atores Jorge Cruz, Marta Cerqueira e Tiago Viegas, criando situações engraçadas sem a necessidade de muitas palavras para que o público se envolvesse na cena rapidamente. Ao falar de velocidade, não posso deixar de enaltecer o ritmo, time de comédia e sintonia entre o elenco. Os resultados de contracenação que esses atores conseguem durante a peça é impressionante, sabendo dosar as nuances de momentos acelerados e mais calmos da história. Além disso, a confiança e o jogo criado e sustentado pelo elenco em cena se tornavam muito bonitos de se ver, pois ali ficava bem claro um dos princípios básicos da confiança de um ator no seu colega durante o evento teatral: a busca da segurança nos olhos do parceiro em cena.

A relação corporal entre o elenco era evidente e a maneira como ela conduzia o espetáculo propiciava aos espectadores um outro tipo de perspectiva de como uma peça de teatro pode fugir às convenções. Apesar do espetáculo não se propor a apresentar uma inovação estética, nem muito menos evidenciar a virtuose técnica dos seus artistas, cito aquela questão na frase anterior, pois o elenco soube dosar com sutileza todo o seu repertório físico, sem fazê-lo desaparecer em cena. Aliás, para quem conhece, saltava aos olhos o domínio que os atores tinham de todas as técnicas referidas anteriormente. Estava tudo ali. Porém, sem levar o exercício à cena, à mera exibição de técnicas, o teatro físico se fazia presente, mas estava tão coerentemente posto dentro de um contexto que o público em geral podia se envolver na história acreditando na veracidade daquelas personagens, mesmo que em uma situação absurda.

Aos que estudam alguma das vertentes do teatro físico, esse espetáculo foi uma aula de como se utilizar todas as ferramentas exaustivamente trabalhadas nas salas de ensaio e trazê-las para uma atuação realista, em um texto que dialoga com o teatro do absurdo. Aí reside a grande dificuldade desse trabalho e o louvor que devemos oferecer ao elenco, pois a dosagem foi precisa. Ressalto ainda as variações de tensões utilizadas pelos atores, quando manipulados pelos seus colegas, em alguns momentos se utilizando de um “relaxamento conduzido” e em outros de uma “rigidez mecânica”, propiciando momentos hilários aos espectadores na medida em que íamos acompanhando o destino físico das personagens.

Além disso, não posso deixar de falar em precisão. As marcações físicas dos atores eram muito precisas e necessitavam que assim o fosse, pois o risco de acidentes em cena é enorme. Mesmo quando nos parece que os atores não estão alertas, eles nos surpreendem com uma prontidão imediata. Esse refinamento de trabalho é muito difícil de ser atingido.

Outro aspecto que gostaria de sublinhar, se refere à técnica vocal dos atores. Cabe aqui fazer uma reflexão, pois não é a primeira vez que assisto a um espetáculo de teatro vindo de Portugal e sempre fico impressionado de como os atores portugueses falam bem em cena. Apesar das diferenças entre a pronúncia portuguesa e brasileira, sempre observo que os atores portugueses sabem fazer os seus textos serem bem ouvidos, bem compreendidos e muito bem articulados. Essa observação sempre me chama atenção ao fato de que os atores brasileiros não dão a devida atenção à técnica vocal ou se equivocam ao utilizarem preparações baseadas em empirismos intuitivos de alguns “mestres”. Não é incomum observarmos um espetáculo de teatro brasileiro onde algumas frases ditas pelos atores fujam a nossa compreensão, se percam numa dicção e emissão falhas, ou o que, infelizmente, acontece e muito: os atores falam, sem observar, significar e compreenderem o porquê suas personagens estão dizendo aquilo.

A direção de John Moiwat, com assistência de Katrina Brown, teve um papel muito importante ao saber conduzir o potencial técnico dos atores para marcações de cena limpas e muito precisas. Mesmo com uma temática que, por vezes, adquira um caráter pesado no espetáculo, a direção soube dosar esses momentos e explorar as situações nos momentos adequados. Além disso, também foi utilizado um recurso de explorar cenas no back stage, o que pode ser um risco, já que a tendência do público é se dispersar. Porém, quando os acontecimentos se direcionavam para as coxias, o público acabava ficando curioso sobre o que viria e não chegava a se dispersar, uma vez que essas cenas não se prolongavam.

Acredito que a direção poderia ter dado um pouco mais de ênfase na construção interna das personagens e do estímulo à sentimentalidade entre as relações daquela família. Apesar de a proposta explorar o humor e o dinamismo físico dos atores imprimir toda a interlocução cênica, acredito que o diretor poderia ter estimulado os seus atores um pouco mais para darem o devido peso que algumas situações exigiam, como por exemplo, o momento em que o filho revive o Natal em família e seus pais já estão mortos. Mesmo em se tratando de um contexto absurdo e sem desejarmos cair nas armadilhas da pieguice, senti falta desse refinamento na busca pelas emoções internas das personagens.

A cenografia de Kevin Plum nos propunha um ambiente cênico limpo, apenas com os itens mínimos e funcionais necessários à proposta de jogo cênico. Uma mesa em proporções fora do comum ficava localizada no centro de cena, sendo utilizada como suporte para as mais variadas situações. O espetáculo contava ainda com gravação e edição de áudio de Tiago Cerqueira e iluminação de Luís Moreira e Paulo Cunha. Todos os elementos cênicos foram utilizados de maneira limpa, propiciando que o foco da encenação ressaltasse o trabalho físico dos atores.

Portanto, apesar do Chapitô não ser muito conhecido no Brasil, acredito que a vinda desse grupo ao 19º Porto Alegre Em Cena vem a propor uma aproximação maior entre as culturas desses dois países ligados historicamente. Além disso, considero ser de extrema importância a vinda dessa companhia ao nosso estado não apenas pelo seu valor artístico. Mas, também por podermos observar o trabalho competente de um coletivo de artistas muito engajados nas causas sociais do seu país. Quiçá, ano que vem a organização do Porto Alegre em Cena nos brinda com um maior número de espetáculos em língua portuguesa vindos de outros países!

MSc. Vagner Vargas
DRT – Ator – 6606 – Crítico Teatral.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Porto Alegre Em Cena e um Público Ávido por Teatro


Em sua décima nona edição, esse festival internacional de artes cênicas invade a capital e, mais uma vez, firma o seu sucesso, como um dos eventos culturais mais importantes do Brasil. De 04 à 24 de setembro de 2012 serão apresentados diversos espetáculos de dança, teatro, música, oficinas, cursos, palestras, workshops, exposições e etc...

Para quem puder se deslocar até à capital do nosso estado ou para aqueles que lá estão, não faltarão opções sobre o que assistir. A edição desse ano traz vários espetáculos do Uruguay, além de trabalhos vindos da Israel, Argentina, Portugal, Alemanha e França. Obviamente, esse festival não se faz apenas com espetáculos estrangeiros, o público ainda tem a possibilidade de assistir diversos trabalhos oriundos de vários estados brasileiros, nos oferecendo um panorama diversificado da produção artística que foi selecionada pela curadoria do Em Cena.

Nos dias em que lá estive, me surpreendi com o tamanho das filas para entrar nos teatros, além das muitas pessoas que, como eu, se aglomeravam em frente às bilheterias pra comprar ingressos de última hora. Realmente, conforme a organização do evento informou no material de divulgação, as bilheterias não abrem na hora dos espetáculos para a venda de ingressos naquele momento. Apenas as pessoas que já haviam comprado as entradas pela internet estavam retirando os seus tickets. Porém, como todo grande evento, sempre são distribuídos muitos ingressos cortesias, algumas pessoas também acabam comprando em excesso, ocorrem desistências e etc... Nessas situações, esses lugares costumam ser vendidos ou até mesmo ofertados pelos próprios espectadores àquelas pessoas que não compraram seus ingressos com antecedência.

Nos teatros por onde circulei e nos postos de vendas de ingressos, observei que o público queria muito ir ao teatro, mesmo sem conhecer o trabalho que seria apresentado, o seu desejo se refletia apenas pelo prazer de irem ao teatro. Somente esse aspecto já nos ilustra o quanto a população gosta de frequentar eventos culturais e do quanto eles lhes são importantes. Entretanto, não podemos esquecer que estamos em ano eleitoral e a cultura não costuma entrar nos discursos dos políticos, nem mesmo ser incluída com ações específicas para implementar, fomentar e oferecer dignidade de trabalho aos profissionais dessa área.

A cultura não oferece emprego apenas para os artistas e profissionais técnicos envolvidos nos espetáculos, todo o comércio local lucra com os turistas que se deslocam até esses espaços, além do mercado informal que se forma à volta dos teatros, proporcionando trabalho e fonte de renda a diversas famílias. Com certeza, Porto Alegre ganha muito durante o Em Cena, não apenas no aspecto comercial, mas também na oferta cultural aos seus moradores e visitantes.

Infelizmente, existem poucas cidades no Brasil onde ocorre uma comunhão de ações como essas para incentivar a cultura e oferecer tantos espetáculos à população. Alguns poderiam justificar a ausência desses eventos devido ao alto custo que uma produção dessas envolve. Entretanto, com trabalho e muita força de vontade se consegue obter o devido sucesso. Porém, para que isso seja possível, há a necessidade de vontade política, investimentos da iniciativa privada, abertura e apoio da mídia, além de mão de obra competente para organizar um festival dessa dimensão. Também não podemos deixar de destacar que o Porto Alegre Em Cena não iniciou nas proporções em que hoje está. Um evento desse tamanho necessita uma construção eficiente e sólida ao longo dos anos. Aqui, nos fica exposto o seu sucesso consolidado como um dos eventos culturais mais importantes do país.

Além disso, ouvi algumas pessoas reclamando dos valores cobrados pelos ingressos, pois, segundo elas, estavam muito altos e a grande maioria da população não teria condições de arcar com esses custos. Sempre que ouço esse tipo de declaração, eu me pergunto sobre os valores que as pessoas pagam para irem aos estádios de futebol, festas, baladas, nos gastos que têm com bebidas alcoólicas, cigarros, alimentação e transporte nesses locais. Porém, não costumamos ouvir as pessoas dizerem que não vão em tal boate ou estádio de futebol porque os custos totais dessa ida serão muito altos. As pessoas economizam, juntam dinheiro, ou até mesmo pagam, sem reclamar. Entretanto, quando falamos em eventos culturais, esse tipo de argumentação sempre vem à tona, trazendo consigo uma falsa justificativa de que os eventos culturais são elitistas.

A cultura, nesse caso as artes cênicas em geral, empregam muitos profissionais e esses trabalhadores necessitam ser remunerados dignamente pelas atividades que desenvolvem. Quando um espectador está pagando para assistir a um espetáculo, ele não está entregando o seu dinheiro em vão, ele está contribuindo com o salário de todas as pessoas envolvidas naquele trabalho que está ali sendo apresentado e lhe propiciando entretenimento, diversão, reflexão, conhecimento, cultura e etc...

Bom, termino esse texto por aqui, pois em breve trarei novas “notícias do front” e as minhas percepções sobre os espetáculos que assisti. Além disso, não posso deixar de terminar esse texto sem pedir aos leitores que, quando forem votar nesse ano, pensem e reflitam bem, se o candidato que estão escolhendo lhe representa e se suas propostas não são meras promessas de campanha para iludir a todos com os chavões antigos de caça votos fáceis. A minha bandeira é a cultura e assim sempre será, pois acredito nas contribuições positivas que ela propicia à sociedade como um todo. Agora, entrego a vocês essas reflexões.

MSc. Vagner Vargas
DRT – Ator – 6606 – Crítico Teatral.