Mais uma vez, o Centro de Treinamento do Grupo Tholl serviu de local pra a apresentação de um espetáculo de teatro em Pelotas. No dia 19 de junho de 2011, foi apresentado o espetáculo “As Linhas de Elise”, uma adaptação do texto “Por Elise”, de Grace Passô, também responsável pela concepção cênica. Além disso, a equipe contava com a direção, adaptação e trilha sonora de Mariana Lohmann, projeção de Marcos Caye, iluminação de Vinícius Blacon, contra-regragem de Nelson Helo e Gustavo Scherer, este último também responsável pela maquiagem dos atores.
A peça conta a história de Elise, uma dona de casa que revive as memórias dos seus vizinhos, utilizando como fio condutor dos fatos, a metáfora do ritmo de uma estação de trem, onde vidas se cruzam para seguirem novos caminhos, tecendo uma narrativa nem um pouco realista. As histórias envolvem temáticas relacionadas às relações humanas e a super proteção pelo medo de se envolver com o mundo, construindo uma dramaturgia fora do convencional.
Esse espetáculo foi concebido por egressos da faculdade de teatro da Universidade de Santa Maria/RS, oriundo do trabalho de conclusão de curso de Mariana Lohmann. Indubitavelmente, percebe-se que houve uma proposta de concepção para encenação bem elaborada e pensada nos seus mínimos aspectos. A direção optou por utilizar o espaço cênico com múltiplas possibilidades para as entradas e saídas dos personagens, direcionamento de cenas que ocorriam dinamicamente pelo meio da plateia e recursos de projeção. Possivelmente, essa opção foi criada com o intuito de ser mais um elemento que corroborasse à ênfase da proposta de dramaturgia não realista que foi empregada. Devido aos custos e às dificuldades técnicas, o teatro gaúcho pouco utiliza o recurso de projeções, quando as propostas cênicas permitem esse tipo de tecnologia em cena. Por esse motivo, quando o público vê o diálogo com outras mídias na cena teatral, costuma sair encantado. Entretanto, os recursos tecnológicos nem sempre são bem empregados nos espetáculos nacionais. Muitas vezes, apenas são utilizados para dizer que ali estão. O que não foi o caso em “As Linhas de Elise”, pois a direção utilizou essa ferramenta de maneira ponderada e eficaz.
O título desse texto não foi posto por mero acaso, pois, após assistir a essa peça, fiquei refletindo sobre o excesso de técnica que às vezes carregamos para o momento da comunhão com o público. Me refiro a esse aspecto, uma vez que o elenco composto por Antônio Orellana, Amanda Hoffmann, Douglas Jung, Elis Genro, Ícaro Costa, Nelson Girard e Marcos Caye se mostrava bastante jovem, vigoroso e com uma gama imensa de técnicas recém aprendidas na academia. Um dos grandes desafios de um artista quando passa pela academia é saber dosar entre a técnica e a arte. Os recursos técnicos de atuação, sejam eles quais forem e/ou ligados a poética que forem, devem ser apenas ferramentas que ampliaram nosso repertório estético e criativo, para permitirem outras possibilidades quando partimos para a arte.
Obviamente, esse tipo de percepção somente a maturidade nos confere. Entretanto, ao observar aqueles jovens atores e reconhecer as bases de seu trabalho, percebia o quão técnicos eles estavam sendo, o quanto haviam estudado e se dedicado para transfigurarem em seus corpos aquelas habilidades. Talvez esse tenha sido o motivo pelo qual não consegui me envolver emocionalmente com o espetáculo, pois as correntes acadêmicas ainda estavam muito arraigadas nos corpos daquele elenco. A academia e os cursos livres de formação de atores lhe fornecem mecanismos teóricos e técnicos para que, no futuro, o profissional que tenha vocação para o teatro, venha a utilizá-los de maneira que lhes permita outra abordagem criativa. Porém, o grande desafio para os artistas inexperientes é conseguir fazer com que a técnica fique imperceptível ao público, uma vez que teorias e conceitos do trabalho prático dos atores se direcionam apenas aos trabalhadores desse setor.
Por sua vez, os espectadores saem de suas casas e vão ao teatro para verem uma história ser contada, entrarem naquela atmosfera imaginária e se envolverem com as situações vividas pelos personagens, não para saberem quais teorias nortearam o processo criativo dos atores, nem tampouco qual a técnica utilizada por eles. Aqueles que desejam obter essas informações, costumam procurar o elenco após as apresentações e dialogar sobre esses assuntos. Entretanto, de um modo geral, o público quer ver teatro e não demonstrações técnicas.
Em contrapartida, não quero que esse comentário soe como crítica negativa ao trabalho dos atores. Muito pelo contrário, pois todos mostravam um bom nivelamento das atuações, estando muito entregues às cenas e com um material bruto ainda por ser lapidado. Nesse sentido, tenho certeza de que a maturidade irá aprimorar ainda mais as qualidades daqueles jovens artistas e ainda teremos o prazer de assistir a outros espetáculos em que estejam atuando.
Portanto, gostaria de finalizar esse texto dizendo que a ida ao teatro é sempre válida e que o público pelotense precisa voltar a frequentar os eventos culturais dessa cidade. Durante muitas décadas, os pelotenses eram reconhecidos como pessoas que consumiam muita cultura. No entanto, o que vemos atualmente é que as artes deixaram de fazer parte do cardápio da população pelotense. Sendo assim, termino esse texto ainda esperando ver o público dessa cidade mais motivado a frequentar os espetáculos teatrais que por aqui passarem.
MSc. Vagner Vargas
DRT – Ator – 6606 – Crítico Teatral.
vagnervarg@yahoo.com.br www.ccetp.blogspot.com
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