terça-feira, 15 de junho de 2010

Turn Off the Play, Theater Was Over!

Talvez este seja um dos textos mais difíceis, ou mais fáceis que já enfrentei. A explicação para este fato está contida na crítica que tecerei ao espetáculo Play – Sobre Sexo, Mentiras e Videotape, apresentado no Teatro Guarany, na gélida noite de 13 de Junho de 2010. Esta peça é uma adaptação do Filme Sexo, Mentiras e Videotape de Steven Soderbergh (1999), feita pelo ator Rodrigo Nogueira.

Para não entrar de sola na adaptação teatral, gostaria de postar algumas palavras sobre o Teatro Guarany, de propriedade da família Fetter, o único em funcionamento na cidade, já que o Prefeito Adolfo Fetter Júnior autorizou o fechamento do Teatro Sete de Abril para reformas ainda não iniciadas. Além disso, o Teatro do Círculo Operário Pelotense (COP) também está com suas portas fechadas, visto que não dispõe de condições técnicas mínimas para que uma produção teatral seja apresentada em suas dependências. Devido a isso, as peças de teatro que são delineadas para apresentações em palco italiano contam com apenas um local disponível para este fim em Pelotas: o Teatro Guarany. Apesar de cobrar um aluguel altíssimo por uma noite de apresentações, o Teatro Guarany não dispõe de equipamentos de sonoplastia e iluminação próprios, fazendo com que os grupos de teatro, ou a produção local, contrate serviços de outras empresas, para que a casa de espetáculos possua condições de receber um evento teatral nestes moldes. Além deste fato, não posso deixar de comentar que os assentos do teatro não serem nem um pouco confortáveis, são barulhentos e muito próximos uns dos outros, fazendo com que o público fique apertado em uma plateia lotada de cadeiras. Obviamente, por se tratar de um prédio histórico, o Teatro Guarany não foi construído tendo em mente um projeto de calefação ou climatização interna. Entretanto, este quesito deveria ser abordado, caso ocorram reformas naquele prédio, pois, neste dia a temperatura estava abaixo de 10°C e a sensação térmica dentro do teatro se comparava quase a uma geladeira. Mesmo assim, boa parte do público presente aguentou até o final da apresentação.

A capacidade de lotação do Teatro Guarany supera os mil espectadores. Porém, foi possível observar que havia uma plateia cheia, mas não lotada e camarotes vazios. Esta constatação me fez refletir sobre o valor do ingresso cobrado pelo contratante local e o tipo de teatro que as empresas contratantes escolhem para ser apresentado em Pelotas. Mesmo com uma proposta de facilidade de aquisição de ingressos para os comerciários locais, observei uma plateia não condizente com a quantidade de trabalhadores do comércio local que poderiam estar presentes neste evento. Talvez, por se tratar de uma peça com atores de novela, o que já traria por si só um pré-julgamento do público à cerca da aproximação de linguagens entre a televisiva e a teatral, tenha influído na decisão dos pelotenses em pagar um ingresso caro para assisti-los ou permanecer confortavelmente em suas residências, ligar a TV e acompanhar algo semelhante, de forma gratuita. Ou, ainda melhor, assistir algo que pudesse ter nem que fosse um pouco de qualidade artística. Como ator, sempre preferi uma plateia cheia de espectadores, a um teatro imenso e vazio. Refiro isto, pois, um espetáculo deste tipo, quando vem a Pelotas, já sai com seu contrato fechado do centro do país, não dependendo do lucro das bilheterias locais. Por este motivo, acredito que, se não havia necessidade de lucro do borderô pelos artistas, a empresa contratante, deveria ter disponibilizado mais cortesias aos estudantes de teatro, dança e das artes em geral desta cidade, visto que este é o seu foco de aprimoramento profissional. Mesmo que houvesse ocorrido um sucesso de público, a distribuição de cortesias não iria afetar aos lucros do borderô, nem muito menos superlotar o teatro.

Como o Teatro Guarany não dispõe de equipamentos de luz próprio, foi utilizado um sistema de montagem de luz que prejudicou o espetáculo em questão, pois haviam estruturas de torres de iluminação, comumente utilizadas em shows musicais e que não funcionaram para esta montagem teatral. A iluminação do espetáculo pecou em vários quesitos. Acredito até que o espetáculo deva ter um plano de luz adequado a sua proposta e talvez bem estruturado. Mas, me atenho a comentar o que foi apresentado. O técnico de luz do espetáculo não soube afinar a luz, nem se adaptar aos materiais de que dispunha, optou apenas por iluminar as cenas. Porém, iluminou mal, já que a luz estava extremamente vazada, chapada, sem nuances, refletindo na estrutura metálica das torres. Em certo momento, abriram dois focos de cor lilás ao fundo, sem a menor relação com a cena que estava ocorrendo. Pareceu-me que o iluminador, resolveu testar uma possibilidade cromática fora de contexto. Além disso, o espetáculo contava com uma excessiva utilização do recurso de Black out, quebrando o ritmo das cenas – que já era fraco – e totalmente fora de propósito. Esta opção de direção foi muito equivocada, pois, a cada momento de escurecimento o espetáculo perdia mais o seu ritmo e não se justificava o uso desta ferramenta, visto que, em algumas cenas os atores faziam trocas de cenários às claras, enquanto algum fato se desenrolava.

Outro fator irritante à plateia foi o ruído das caixas de som, localizadas à frente do palco que atrapalhavam a escuta das falavas dos atores. Apesar dos atores terem optado pela não utilização de microfones durante suas falas em palco, haviam microfones que captavam as falas nas coxias, ficando ligados durante todo o espetáculo, com um forte ruído. Realmente, o Teatro Guarany possui uma péssima acústica para apresentações teatrais que não se utilizam de microfones. Neste sentido, destaco como ponto favorável a coragem destes atores em representarem esta peça, apenas fazendo uso do seu aparelho vocal, o que por si só preconiza um esforço a mais, tendo em vista a inadequação acústica do local.

No que se refere ao trabalho dos atores, foi possível observar uma total ausência de time, tanto nas falas, quanto na condução do ritmo da peça. Falas monocórdias, inexpressivas, que mais pareciam uma imitação mal feita dos sitcoms norte-americanos. Obviamente que este tipo de montagem atende aos referenciais de sua equipe e ao molde do elenco a que se propõe. Neste sentido, por ser uma montagem comercial voltada para atrair ao público pelo nome de jovens estrelas das telenovelas, eu já fui ao teatro sem grandes expectativas, mas, sempre guardo em meu íntimo o desejo de ser surpreendido. Não foi o caso.

Havia uma total ausência de força cênica, uma direção com uma criatividade muito aquém do que o público que frequenta teatros espera. O referencial televisivo estava muito presente em todo o espetáculo e não apenas pelo fato do texto ser uma adaptação baseada em um filme, nem pelo fato dos atores terem carreiras televisivas, mas na condução de uma dramaturgia que talvez funcionasse em outras linguagens. Porém, no teatro não funcionou. Entretanto, para os estudantes de teatro e para os artistas em geral esta foi uma ótima oportunidade de também verem como se faz teatro equivocado. Acredito que o grande destaque de má atuação seja o ator Sérgio Marone, visto que não conseguiu imprimir nenhuma emoção e nenhum ritmo a nenhuma sílaba que disse, por mais que seus colegas de elenco se esforçassem em manter o ritmo do espetáculo, ele quebrava o ritmo e atrapalhava ao andamento do espetáculo.

Em contrapartida, nem tudo foi ruim neste espetáculo. Houve um momento, em que o trabalho de diálogos simultâneos de duas cenas deu um aspecto interessante à montagem. Além disso, destaco o esforço da atriz Cintia Falabella em tentar imprimir ritmo à peça e à maneira como atuou, enquanto era filmada, tendo sua imagem projetada na rotunda. Acredito que os problemas do espetáculo não se devam somente ao elenco, visto que caberia ao diretor saber tirar o que de melhor cada ator possuía e imprimir um ritmo melhor ao espetáculo. O final da peça era fraco, bobo, quase fez o público levantar e sair sem aplaudir. Entretanto, observei que nenhum expectador levantou para aplaudir, demonstrando que aqueles aplausos eram apenas em educação pelo trabalho executado pelos artistas e não pela qualidade do que foi apresentado.

Algumas coisas me fizeram refletir, após assistir a esta peça de teatro, pois a mídia local deu um imenso destaque à vinda dos artistas de novela à cidade, em especial, ao jornal impresso de maior circulação na cidade – que também pertence a mesma família proprietária do Teatro. Em face disso, penso naquelas pessoas que saíram de suas residências em um dia tão frio, na esperança de serem tocados com uma obra artística, ou até mesmo aqueles que foram pela primeira vez a um teatro. Será que, após terem assistido a um espetáculo desses, estas pessoas retornarão às plateias dos teatros? Além disso, existe algum tipo de percepção ou reflexão das pessoas que fazem a mídia local sobre o valor e o destaque que dão a produtos massificados de uma cultura descartável?

Desta forma, termino este texto esperando que espetáculos com qualidade artística capaz de tocar aos espectadores possam ter o mesmo tipo de destaque na mídia local que os frutos televisivos têm quando aqui desembarcam. Tudo bem que a emoção do público ou a gargalhada sincera não renderão tantos comentários nos tradicionais salões pelotenses, como as fotos que sairão nas colunas sociais ao lado das estrelas “globais”, mas os espaços midiáticos deveriam ser mais democráticos, inteligentes e menos alienados.

MSc.Vagner Vargas
DRTAtor – 6606 -Integrante do Clube dos Comentaristas de Espetáculos Teatrais de Pelotas (CCETP).
www.ccetp.blogspot.com
vagnervarg@yahoo.com.br

Um comentário:

  1. "jornal impresso de maior circulação na cidade – que também pertence a mesma família proprietária do Teatro", ou seja, jornal Diário Popular e família Fetter Zambrano.

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